quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

Privataria



Saí de férias e, claro, vim pra Guará. Na mochila - sim, mochila, porque quando venho para cá não trago mais do que a roupa do corpo, independentemente de quantos dias hei de ficar - trouxe "Cronistas do Estadão", que Aurélio Blau-Blau me emprestou sob condição de me exilar na Sibéria caso eu rasure 1% de qualquer folha do livro que, aliauses, era do pai dele, o velho e bom Albano. Deixei em Londrina uma velha edição de “Incidente em Antares”, surrupiada de um médico amigo que, acredito, nem lembra da existência dela. Meus planos era matar o livro de crônicas na minha passagem por aqui e levar o livro do pai do Luís Fernando Veríssimo para a praia, em janeiro, mas o fato é que as crônicas não deram para o cheiro. Em dois dias li todas, de forma que fiquei, literariamente falando, a ver navios. Todo esse narizaço de cera para contar que ontem, quarta, dia 28, comprei o tal “A Privataria Tucana”. Estava no Shopping Ribeirão. Tinha ido acompanhar meu irmão numa parada de trabalho e resolvemos almoçar por lá, na esperança de ver algumas ribeirão-pretanas de fechar o comércio, mas o máximo que conseguimos foi cruzar com uma antiga professora nossa de primário. Fui à livraria comprar jornal e o tal livro-bomba me fisgou. Mesmo sem ler, já havia desconfiado do bicho numa troca de e-mail com um grande amigo. O erro – se assim for confirmado – foi ter parado na frente dele. A editora me fisgou como a uma tilápia faminta. Na capa, como um Sunday derretendo na sorveteria da dona Celita, está lá: “Os documentos secretos e a verdade sobre o maior assalto ao patrimônio público brasileiro”. Nas orelhas, em que a editora oferece “clareza e objetividade jornalísticas”, as últimas linhas são um resumo comparável a doce de leite comido de colher: “Temos aqui um livro-denúncia de rara contundência no seu gênero”. Lembrei do Paulo Lima me cutucando na mesa de sinuca do Jota: “E aí, você viu?”. Lembrei de alguém me dizendo que o autor é de Londrina. Lembrei de que não tinha nada em casa para ler. Paguei 39 paus e trouxe o menino. Entendo quase nada de mercado editorial, mas está lá que o editor é Luiz Fernando Emediato, de quem ouvia falar muito na época da faculdade, como jornalista da grande imprensa. A nota do editor, que antecede os primeiros capítulos, oferece um produto ainda melhor e mais impactante que as orelhas ofereciam. Pensei: caramba, não pode ser ruim um troço assim. Não tenho absolutamente nada a ver com os tucanos. Nunca votei num tucano, nem federal, nem estadual, nem municipal. Minto: votei, certa vez, acho que na eleição que elegeu Cheida prefeito de Londrina, no Jubão, que era do PSDB, mas no Jubão eu votaria mesmo se fosse do PDC, não tinha nada a ver com ideologia. Sempre admirei Covas, e não passa muito disso. Acho que Serra fez um bom trabalho no Ministério da Saúde ao implantar um programa exemplar de tratamento e combate à AIDS e ao quebrar patentes de remédios que interessam a todos. De resto, só lembro dele levando bronca do Felipão por se meter a dar palpite na escalação do Palmeiras em 1999, durante a Libertadores. Tampouco morro de amores por ele e por FHC, em quem nunca votei e com quem só mantive contato uma vez, em 1984, quando eu tinha acabado de entrar na UEL e uma amiga já petista de carteirinha me levou para Assis a fim de participar de um congresso de sociologia que reuniu Fernando Henrique – então com olheiras enormes – e Florestan Fernandes. Acho, porém, um pé no saco o maniqueísmo que se instalou no debate PT x PSDB. Virou uma guerra de baixíssimo nível que, de tão feroz, entorpece a todos e não permite que se veja absolutamente nada no horizonte que não sejam os próprios contendores. Até parece que só existem eles no mundo. Azar nosso que os outros partidos não conseguem nos arrastar para fora dessa briga idiota, em que os caras ficam se digladiando pelo poder e nós – que não temos cargos nem parentes no governo – ficamos chupando os dedos. Aliás, se dependermos de partidos, estamos ferrados. Por isso acho legal, mesmo com eventuais exageros, esses movimentos espontâneos como o do pessoal que se revoltou contra a derrubada das árvores no Bosque. É preciso encontrar uma válvula de escape para essa situação sufocante em que nos meteram. Precisamos encontrar a tal luz no fim do túnel, para a qual tucanos e petistas nunca vão nos levar, porque uns estão querendo recuperar o terreno perdido e os outros estão defendendo o território ocupado a todo custo. E foda-se liberdade de expressão. E fodam-se princípios de toda ordem. Houve roubalheira na privatização? Até um paralelepípedo bêbado sabe disso. Mas imaginem, meus amigos, o governo com Embratel, Light, CSN, Vale, todos os bancos estaduais e uma carrada de outras estatais todas sob o controle do PT. Credencruis. Vamos ser sincerros: deozolivre. Enfim, comprei “A Privataria Tucana” para ler assim, com os olhos de advogado do diabo, com um pé atrás, mais até como um desafio imposto pelas críticas de amigos petistas de que não viram nada sobre o livro – contra ou a favor – na grande imprensa. Li os três primeiros capítulos, de poucas páginas cada. Já tenho as primeiras impressões e lhes digo uma coisa: o cheiro não é nada bom. Prometo uma opinião clara quando terminar.

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