Uma coisa aparentemente não tinha nada a ver com a outra, mas o fato é que fui ver Os Beto tocar no Bar do Pingüim, nesta sexta-feira à noite, ainda com a polêmica da OSUEL na cabeça. Horas antes, tinha lido matéria de Paulo Briguet no Jornal de Londrina informando sobre os cortes de cargos gratificados determinados pelo reitor Wilmar Marçal entre músicos da Orquestra Sinfônica. Mais do que informar sobre os cortes, a matéria contextualizava a situação: trata-se de uma briga entre o atual reitor e a ex, agora secretária de Ciência e Tecnologia, Ligya Puppato. Marçal alega estar apenas cumprimento ordens do governo: cortar funções gratificadas. O que ninguém esperava é que os cortes viriam em cima da OSUEL, comprometendo a formação da orquestra e a condenando, senão à morte, pelo menos à UTI. Na mesma edição do JL, na página de programação cultural, vi uma nota anunciando Os Beto no Pingüim. Como acompanho aquele bando da manés há no mínimo uma década, desde que abrilhantavam a noite no bar da Casa do Jornalista, fui conferir. Estão melhores do que nunca. Nesses anos todos, sai um, entra outro, o núcleo artístico continua o mesmo e o entrosamento, claro, melhorou. Está supimpa. Aquele negócio de todo mundo entrar junto e terminar junto, voz, cozinha e cordas, isso sim caracteriza uma boa roda de samba. Horácio continua se divertindo, no atabaque, como se fosse um garoto. Dali, dei uma esticada até o Valentino. Fazia tempo que não ia lá. Não curto muito esse lance de fila pra entrar e homens de preto pra lá e pra cá, mas, enfim, meu vizinho de vilinha aqui na Rio de Janeiro, o Wesley, saxofonista, faz um singelo convite e resolvi encarar. Quando tirava o carro da garagem para ir ao Pingüim, ele também saía de casa paramentado. Disse: “Se agüentar o rojão, dou um pulo lá”. É, véio é phoda. Aos 44, não dá mais pra embalar noite adentro. Mas saí razoavelmente são do Pingüim e fui ao Valente. O pessoal do Wesley já estava tocando. O grupo, se as cervejas do samba e o conhaque do Valentino não queimaram toda a minha memória, chama-se Sarará Criolo. Ia continuar tomando cerveja, mas daí um ruído na comunicação mudou as coisas. Cheguei ao balcão e, naquela barulheira infernal, gritei pro cara: “Uma neck”. Ele: “Hein?!?”. Joguei o corpo pra frente e gritei. “Uma neck!” Um minuto depois ele voltou com um conhaque. Fazer o quê? Mas o que ia dizer que o Sarará Criolo é um puta grupo. Um bando de nego mais ou menos da minha idade, um pouco mais novos, cantando o fino. Entrosadíssimos, também. Wesley lá atrás, com outro colega de sopro, dando o molho. Quando cheguei, entoavam “Vale Tudo”, do Tim Maia. Daí, entre algumas gordinhas loiras, encouraçado na minha desenvoltura germânica, fiquei matutando. Poxa, Londrina sempre teve uma noite movimentada. Graças ao esforço de muita gente, sempre houve música ao vivo na cidade. Uns anos mais, uns anos menos, mais a noite nunca morreu em Londrina. Cheguei à cidade em 1984 e, de cara, passei a freqüentar Lumiar, Clube da Esquina, Bar do Jota, Tio Mário, Milton, Cebolinha, Paulista, Nanico, Sereno, Bar da Costela, Mocidade (quando ainda era na BH com Fernando de Noronha), Pingão, Cotovelo e, claro, as festas no RU. Tinha o Padock na Maringá, o Tigrão perto dali. E a moçada que entrava na UEL abastecia o mercado de músicos da noite. Meus colegas de Jornalismo da turma 1984/1, Luisinho e Marcão, cantavam Língua de Trapo no Lumiar. Pedrinho Livoratti, meu calouro, arregaçava no Clube da Esquina, junto com Tadeu Far Way. Café Set e Castelinho, na Higienópolis, também abriam as portas para som ao vivo. Era gente que ganhava pouco, mas curtia o que fazia. Ana e Banda no Villa Terra, Banda Beco arrepiando, Madera, pô, um monte de gente. O Ângelo Galbiatti, do Madera, coincidentemente, estava lá no Pingüim, cuidando do som pr’Os Beto. Kadu Guariente, baterista da Banda Beco, está louco para escrever um livro sobre a história do rock de Londrina nos anos 80. Victor Gorni acaba de lançar um belo CD. Nesse mesmo dia, tinha recebido uma proposta para transformar em livro um grande trabalho acadêmico sobre os conservatórios musicais da cidade. Caramba, as coisas acontecendo e uma briga mesquinha entre dois grupos políticos encastelados na universidade ameaçando a formação de um patrimônio cultural da cidade? Ao invés de estimular seus correligionários a apoiar, a criar espaços, a elaborar leis que garantam a continuidade desse pessoal que faz cultura muitas vezes na marra, no suor, no sufoco, esses líderes, ao se engalfinharem, vão pra cima da OSUEL? Caramba, esse pessoal merece mais respeito. Mais consideração. Que o reitor e a ex-reitora se entendam, sentem-se à mesma mesa, dialoguem, façam algo produtivo, positivo para a OSUEL e a cultura da cidade. Trata-se de um segmento que historicamente sofre com o descaso e que não precisa de iniciativas contrárias. Deixar a OSUEL ser desmantelada significa fecharmos os olhos e sermos ameaçados também, de repente, de perder o FILO, o Festival de Música. Londrina sempre se vangloriou de ser inquieta, crítica. Que não se cale agora. Ou, como disse Briguet ao final de sua matéria no JL, muito apropriadamente, por sinal, “toque-se com um barulho desses”.
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Que memória cara, parabéns!
ResponderExcluirSantiago
A-DO-REI heheheh...aliás quem tinha que escrever um livro é vc!! abração
ResponderExcluirKadú