(Publicado na seção Boas Histórias, do site da Sercomtel)
Tem lugares que mudam, mudam e continuam o mesmo, invariavelmente com a mesma vocação. É o caso da Vila Ipiranga, na área central de Londrina. Delimitado – sem nenhum rigor científico – pela avenida Bandeirantes, a rua Mato Grosso e um pedaço da JK, o bairro é o mais boêmio da cidade. São, na verdade, alguns poucos quarteirões que abrigam – sempre abrigaram – muitos bares, por onde passaram figuras lendárias, como o desenhista Dom Pablo, que hoje dá nome ao renovado Gelobel do Parque Guanabara.
Se Londrina, por motivos históricos e de afeição, tem muito mais a ver com São Paulo do que com a própria capital do Paraná, é plausível comparar a Vila Ipiranga com a Vila Madalena, bairro nobre paulistano famoso por seus botequins e pelas repúblicas recheadas de estudantes com sede demais e dinheiro de menos, ávidos por um lanche barato e um violão ao vivo.
Os estudantes universitários sempre tiveram uma predileção pela Vila Ipiranga. Por causa, evidentemente, dos bares, que mudam de lugar, trocam de dono, mas não perdem a clientela. O Bar do Jota, na rua João Cândido quase JK, é até hoje ponto de uma fauna pra lá de diversificada. Sob o som da velha MPB e ao redor das mesmas mesas de sinuca se reúnem tribos de toda espécie, de todas as idades, de todas as tendências lítero-músico-sexuais.
Hoje nas mãos de um italiano, faz semanas que corre o boato de que o Jota está prestes a trocar de dono, o que já aconteceu com diversos outros bares do pedaço. O do Cebolinha, na esquina da João Cândido com Jorge Velho, atualmente recebe um público – com mil raposas incendiárias! – absolutamente distinto dos que, antes, ouviam Dom Pablo, entre uma pinga e outra, declamar Augusto dos Anjos.
O Bar do Milton, na João Cândido com Raposo Tavares, já era. O Bar do Souza, na Mato Grosso com Paes Leme, onde foram consumidos um bilhão e meio de torresmos suculentos, também. O Valentino original, na esquina da Jorge Velho com o Buracão do Azevedo, por onde circularam gerações de artistas e malucos, idem. Marcão trocou o bar da Jorge Velho quase Rio de Janeiro por um táxi. O Meeting, na Souza Naves, teve vida curta na década de 80. E o saudoso Tio Mário, ponto de encontro de universitários, profissionais liberais, boleiros e outros desocupados, é outro que fechou as portas depois de peregrinar por dois ou três endereços da Vila.
Mas o Paulista velho de guerra continua lá, na esquina da Jorge Velho com Amador Bueno, com a cerveja gelada, a comida, a sinuca e o pano verde que atraem muitos bacanas da cidade. O espanhol Nicolas – avante, Fúria! – levou sua padaria/lanchonete da esquina da Raposo com a Rio de Janeiro (onde hoje funciona um restaurante tipo “coma quanto puder”) para a descaída da Borba Gato, mas permanece com o dispendioso hábito de apostar com o jornalista Armando Duarte meia dúzia de cervejas em qualquer confronto Corinthians x Palmeiras.
Enquanto uns fecham, outros surgem – como o Zuppa, com sua boa comida a preços civilizados, na Jorge Velho – e outros mudam de dono e de nome. O Bar do Alcides, na Praça do Aleijadinho, perdeu as centenárias teias de aranha e ganhou pintura, mesas e menu mais convidativos. E, na fachada, bem em cima, uma placa amarela com dizerem em preto, que leva o nome, a idade e a marca do bom humor: “Bigorna, desde 1630”. A data é do surgimento da bigorna, e não do bar, evidentemente.
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Pô, então eu moro na "Vila Madalena" de Londrina? Rs... Todo santo dia passo em frente do Paulista. Lugar engraçadíssimo. Os caras me olham com cara de quem não entendem o meu sobe e desce pro Zerão pra ir nadar ou correr. Enquanto eles estão lá, embriagados falando de suas vidas e também das alheias. Eu etambém stive, por muito tempo, do lado de lá do balcão. Hoje os vejo de longe, rio junto. E me satisfaço com as lembranças dos tempos de "butecos".
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