domingo, 26 de julho de 2009

1984, o ano em que fizemos contato


Semanas atrás entreguei a casa onde morava em Maringá e decidi passar uma temporada de engorda e cochilos na casa da família em Guará-SP. Sem documentos, que eu perdera em Londrina na Semana Santa, fui a Maringá resolver tudo de ônibus, para não ia me arriscar na estrada – ainda mais na fase zica em que me encontrava. Até aí tudo bem, não tivesse acontecido uma baita coincidência: o busão da Garcia em que embarquei de volta com destino a Ribeirão Preto fez a linha Ourinhos-Jaú-Bauru. Desde que vim para Londrina cursar faculdade, há 25 anos, sempre percorri, de ônibus ou de carro, o trajeto Assis-Marília-Ribeirão. A única vez em que eu fiz aquele outro roteiro foi justamente nas minhas primeiras férias de meio de ano na UEL. Ingressei em Jornalismo no início de 1984 – “o ano em que fizemos contato”, como se intitula uma comunidade no Orkut criada, se não me engano, pelo Ariel Palácios. Quando, agora, exatamente um quarto de século depois, viajava para Guará, a cidade natal, para descansar a cachola e pensar no que fazer da vida, e o ônibus da Garcia estacionou na rodoviária de Jaú, lembrei daquela viagem de julho de 1984. Quando o busão parou na mesma rodoviária e fez aquele barulho de freio hidráulico que acorda todo mundo, pissccchhhh, ou algo assim, virei o rosto amassado para a janela e, a um metro e meio de distância, no meio da madrugada, vi uma TV ligada, fixada na parede da plataforma, e deu para ouvir o Hino Nacional, e a imagem mostrava a bandeira, e de repente a câmera abriu mais e passou a mostrar um pódio, e me toquei de que estávamos no meio dos Jogos Olímpicos de Los Angeles, e daí reconheci Joaquim Cruz e, caraca, o cara ganhou, o cara ganhou, era Joaquim Cruz com o ouro no peito, o primeiro ouro do atletismo brasileiro desde Ademar Ferreira da Silva, 30 anos antes, e eu ali, vendo tudo ao vivo, ainda que pela TV, no meio da madrugada, dentro de um ônibus, numa TV pregada na parede da plataforma de uma rodoviária, voltando para a minha cidade de férias pela primeira vez desde que me aventurara a fazer faculdade na cidade grande. Acordei de vez, curti aquela transmissão até o final, desci do ônibus, tomei um café com pão de queijo, fumei dois hollywoods e voltei para a poltrona, pisei em três ou quatro pés no corredor, e curti aquela imagem no restante da viagem até Ribeirão, onde pegaria um São Bento para Guará. Agora, quando aportamos em Jaú e lembrei disso, no restante da viagem eu curti muito mais lembranças. Agora tinha 25 anos de imagens para relembrar. Vinte e cinco anos se passaram na vida de uma mané cabaço para caralho que deixou a cidade de então 15 mil habitantes para descer numa rodoviária cujo teto deixava a chuva entrar (mas diziam tudo bem, porque era de um arquiteto famoso), que ficava numa tal rua Sergipe que ficava mais ou menos perto de uma tal rua Paraíba, onde eu moraria numa república em cima de uma tal madeireira Paroschi, perto de uma tal rua Quintino, onde eu pegaria ônibus para ir numa tal de UEL fazer um tal curso de Jornalismo. Em 1984, ano que Londrina comemorava seu cinqüentenário, com Dominguinhos, Osvaldinho e Sivuca num tal de Moringão, com Jorge Ben e Herva Doce – eram os que eu conhecia – num palco flutuante, à noite, no meio de um tal lago Igapó que, vim a saber muito tempo depois, foi construído por um jovem prefeito nascido na minha terra, Antônio Fernandes Sobrinho. 1984, o ano em que fizemos contato. O ano em que eu e um bando de caipiras conhecemos um calouro chamado Homero Barbosa Neto e um monte de outras coisas boas e ruins: um tal de Lumiar, um tal de Clube da Esquina, um tal professor Marinósio, uma tal Campanha das Diretas, uma cidade em dúvida sobre sua própria vocação. 1984... George Orwell, rock nacional, linha desativada de trem, terminal no bosque. Sem Leste-Oeste, sem Catuaí, sem Madre Leônia, uma mosquiteira dos infernos na Humaitá, a caminho da UEL. 1984... Um bando de caipiras de Andradina, Piraju, Olímpia, Palmital, Ibitinga, Guaíra, até um argentino de Curitiba, gente da terra, gente boa pra caralho que entra na nossa vida para sempre, sem pedir licença. 1984... Preciso ver que fim deu aquela comunidade no Orkut.

Um comentário:

  1. rogê, adorei este texto, é claro, porque é minha história tamvém. Aqui no seu vlog não consigo colar a letra v, digo v, de vrasil. No fim, um dos argumentos do Ariel para eu entrar no orkut era para fazer parte da tal comunidade - e ele mesmo saiu do orkut... Essa turma de 84/1 era muito voa!! veijos

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