terça-feira, 15 de dezembro de 2009

Por que a gente é assim?



Para encerrar bem o ano, vamos pagar as dívidas. E a maior delas, agora que o time protagonizou esse vexame histórico no Brasileirão, é explicar por que o Palmeiras consegue tais façanhas. Em um dos posts abaixo, linquei texto do portal Terra que desanuvia a anarquia – no mau sentido – que tomou conta do Palestra. É cartola puxando tapete de cartola, é parceira olhando torto para diretoria, diretoria olhando torto para parceira. O texto é esclarecedor apenas por dar nomes aos bois porque, conceitualmente, desde que me conheço por gente, o Palestra sempre foi assim. Daí, a cada 15, 20 anos, todos aqueles carcamanos de dedo destroncado tomam um porre, se abraçam, choram, se unem de verdade e a gente monta um timão, abastece a sala de troféus e, finda a união, efêmera por natureza, a gente volta a montar e torcer por times medíocres. Não adianta, a gente é assim e acabou. Quer clubinho organizado, bonitinho? Pula o muro. Vira a casaca. Mas não encha o saco. E ser torcedor de futebol, vamos falar sério, é a arte de engolir sapo. É o avesso do avesso mesmo. Havia dito: corajoso daquele palmeirense que, na segunda-feira pós-Brasileirão, teve a coragem de vestir a camisa e sair às ruas. Eu não faria isso temendo que algum bâmbi ou gambá mais desavisado me olhasse com aquele sorrisinho sarcástico, daí eu teria de engolir o sapo ou tomar providências, então melhor ficar quieto. Caramba, o que eu vi de palmeirense a caráter esses dias foi uma festa. Arrisco sem medo de errar: não houve, desde que fracassamos retumbantemente, ficando fora até da Libertadores, outro clube que teve mais camisas desfilando por aí do que o Parmera. Nem do Flamengo campeão. Vi muitas camisas do terceiro uniforme, aquele azul; vi camisas de outro terceiro uniforme, aquele com o qual disputamos algumas Copas do Brasil; vi camisas dos tempos da Parmalat; e, claro, o uniforme oficial, número 1, verdão etc. Vá entender... Enfim, mas eu ia mesmo era explicar por que o Palmeiras, com a liderança folgada e uma tabela favorável pela frente, “consegue”, numa reta final de campeonato, perder 11 de 12 pontos disputados contra as quatro equipes que, naquele momento, estavam virtualmente rebaixadas e, por fim, ficar até de fora dos cinco que iriam à Libertadores. Primeiro, porque com o Palmeiras desgraça pouca é bobagem. Se, de fato, a atuação de bastidor resulta em alguma coisa, então a diretoria do Palmeiras deve ficar atenta à confecção da tabela, agora que, ao que parece, o campeonato de pontos corridos veio para ficar. Não se deve permitir jamais que o Palmeiras, em qualquer momento, encare uma sequência aparentemente fácil de jogos – principalmente numa reta final de campeonato. Jamais podemos deixar que a tabela nos obrigue a enfrentar Avaí, Fluminense, Santo André, Náutico, Sport Recife. Jamais! Temos que exigir da CBF que coloque nossos principais adversários salpicados, aqui e ali, sem que o time tenha tempo de respirar. O Palmeiras, definitivamente, não sabe jogar contra times de menor expressão. Isso é claro. É histórico. Ninguém nunca na história desse país perdeu tantos títulos, vagas, classificações, para os pequenos quanto o Parmera. O Corinthians, quando decidiu título contra a Ponte (duas vezes), contra o Guarani, contra o Botafogo de Ribeirão, ganhou. O São Paulo, quando decidiu título contra o Bragantino (Brasileirão!), Guarani (Brasileirão!), São José, ganhou. O Palmeiras, não. Parece estar no nosso sangue darmos chance, guarida, evidência aos pequenos. Pegamos o Guarani numa final de Brasileirão e levamos na tarraaqueta. Pegamos a Inter de Limeira numa final de Paulistão – já estávamos uma década na fila – e levamos na tarraqueta. Pegamos o Bragantino numa semifinal de Paulistão – ainda estávamos na fila – e levamos na tarraqueta. Uma vez, em 1984, se não me engano, perdemos a chance de ir para a decisão ao perder para o XV de Jaú, em casa, de virada, por 3 a 2, depois de fazer 2 a 0. Uma vez tiramos um tal de ASA de Arapiraca do ostracismo ao ser eliminado em casa pelo dito cujo num mata-mata da Copa do Brasil. E para o Ceará. Se você olhar a tabela e vislumbrar uma trajetória aparentemente fácil para o Parmera, esqueça: o time fatalmente vai fazer a felicidade de algum pequeno. Nossa briga, nossa índole, nos impele a pegar os grandes. Sempre foi assim. No começo, lá pelos anos 20, sapecamos um 8 a 0 no Corinthians só pra colocar os pontos nos is. Nos anos 30, fomos os primeiros tricampeões paulistas da história – título que o São Paulo, por exemplo, não tem. Ainda na década de 30, criaram o torneio Rio-São Paulo e adivinhem quem foi o primeiro campeão? Nos anos 40, o torneio sumiu e nadamos de braçada no Paulistão. Na década de 50 ele voltou e ganhamos um monte. Antes, em 51, fomos o primeiro campeão mundial de clubes ao vencer a Taça Rio, contra os principais clubes do mundo. Na década de 60, montamos a Academia de Futebol – que dá nome ao centro de treinamentos, na Barra Funda. Vestimos a camisa da Seleção e socamos 3 a 0 no Uruguai na inauguração do Mineirão. Na década de 70, a segunda edição da Academia, com a escalação que todo palmeirense com mais de seis meses de idade sabe de cor e salteado até hoje: Leão: Eurico, Luís Pereira, Alfredo Mostarda e Zeca: Dudu e Ademir; Edu, Leivinha, César Maluco e Nei. Nem o Flamengo de Zico neguinho escala desse jeito. E já tascamos um bicampeonato brasileiro. Aí tascamos uma ducha gigante de água fria no Corinthians em 74. Aí veio a década de 80, a nossa década perdida, com os times mais medíocres jamais montados. Tem uns londrinenses aí que se gabam de ter vestido a camisa do Parmera, mas esquecem de dizer que foi na década de 80, quando até Ditinho Souza, Dênis e Vasconcelos jogaram por lá. Conheço uns, dos tempos do Bar do Lelei. Aí chegou a década de 90, montamos a inédita co-gestão com a Parlamat (coitado do Vicente Matheus, só de lembrar dá dó), arregaçamos a boca do balão e encerramos a década ganhando a Libertadores que nos havia escapado em 61 (contra o Peñarol, um ano antes do Santos de Pelé chegar a uma decisão) e 68 (contra o Estudiantes, onde jogava o pai do Verón, esse que vai decidir o Mundial agora com o Barça, numa partida em que alguém, acho que o pai dele, entrou em campo com uma agulha e ficou furando o Da Guia o jogo inteiro). E ganhamos com o Felipão, catapultando para a seleção o técnico que montaria o timaço de 2002 – essa sim, uma Copa gostosa, ao contrário de 94. E os confrontos com o Corinthians nas Libertadores de 1999 e 2000, se querem saber, foram, na opinião, os maiores confrontos da história do futebol. Dois timaços, se encarando ali, frente a frente. Duas camisas de responsa. Dois camisas 10 do caralho. Essa Libertadores é emblemática para essa tese que estou defendendo. O Palmeiras começou ganhando do Corinthians. Depois trupicou nums paraguaios aí e perdeu a partida de volta para o Corinthians, ficou em segundo no grupo e, nas oitavas-de-final, caiu no colo do Vasco, então atual campeão e que havia reforçado a equipe para repetir o título e voltar a Tóquio. Atropelamos o Vasco, passamos pelo Corinthians em duas partidas memoráveis, socamos o River Plate e aí... Deportivo Cali, da Colômbia, pela frente, na final. Caraca, que sufoco ganhar desses caras. O time atropela Vasco, Corinthians e River e, quando é hora de passar por um Deportivo Cali, vira o maior sufoco. Assim é o Parmera. Enfim... Mas ter sido o Campeão do Século, conforme todos os rankings sérios desse país (Estadão, Folha de S. Paulo, Placar), não é o único título que demonstra a grandeza do Parmera. Há também o título de Protetor dos Frascos e Comprimidos, para ficar na zombaria. Nenhum time perdeu tanto para os pequenos quanto o Palestra. O interior deve muito ao Palmeiras. O Guarani, a despeito do timaço de 78, ter sido campeão brasileiro fortaleceu mais o futebol brasileiro do que qualquer resolução da CBF ou do Clube dos 13. E olha que um ano antes, em 1977, o nosso Londrina é que poderia ter beliscado o troféu, mas aí havia um Atlético Mineiro e um São Paulo com Valdir Peres e Chicão à frente. Credo! Mas o fato é que o Palmeiras deve recorrer ao STJD para impedir que a tabela de qualquer Brasileirão preveja quatro, cinco, seis confrontos com times de menor expressão numa reta final de campeonato. O Palmeiras simplesmente não consegue ganhar. Melhor que viessem Grêmio e Corinthians, como ocorreu com o Flamengo. Daí não fariam corpo mole, porque enfrentariam rivalidade de gente grande. E quando o pega é assim, mermão, a gente se transforma naquilo que Ugo Giorgetti já disse uma vez no Estadão: você tem de encarar aquele que está atravessado na garganta de todos os times brasileiros. Menos os pequenos, que, para esses, a gente dá a maior força.

2 comentários:

  1. (De Zé Ganchão, por e-mail)

    O Botafogo, a Portuguesa e os gambás também tem dessas (basta ver o medo do Juventus que os gambás tinham nas décadas de 70 e 80, até comprou o Ataliba, só para ele não fazer gol na gambazada. E o Ataliba só fazia gol neles).
    Agora, faltou a grande Academia
    Valdir, Djalma Santos, Djalma Dias (pai do Djalminha), Valdemar Carabina e Ferrari; Dudu (Zequinha, campeão do Mundo 62, na reserva do Zito) e Ademir da Guia; Copeu, Servílho, Tupazinho e Rinaldo (Galhardo, o canhão peruano). O time era tão bom que o Lula, terceiro reserva na ponta esquerda, foi dado ao Fluminense para poder jogar. O mesmo Lula depois campeão brasileiro pelo Inter. Tinha ainda o Ademar Pantera, que ficou na história depois de ir para a Itália e casar com uma condessa (a dona largou o marido para cair na gandaia com o negrão, senão me engano irmão do Fio Maravilha).
    Foi o único a tirar títulos do Santos de Pelé e Coutinho na década de 60. Em 67/68 o Luizito Artime (maior artilheiro em histórias de Libertadores) entrou na vaga do Servílio.
    sorte

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  2. (De Zé Ganchão, o retificador, por e-mail)

    Porra meu... Teve furo na historinha dos craques da Academia. O Ademar Pantera era irmão do Germano (Flamengo e Parmeiras), um atacante que fez hisstória ao casar com a condessa na Itália. Foi ele, não o Pantera, que comeu a gringa rica e nada tinham a ver com o Fio Maravilha (a não ser o fato de serem negões e terem começado no Flamengo).

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