Há assuntos dos quais não se pode escapar, e a morte de Michael Jackson me parece um deles. Um milhão de desculpas a cada um de seus fãs, mas a morte desse rapaz não me toca em nada além do que a morte prematura de qualquer outra pessoa me tocaria. Não curto música pop norte-americana. Não curto aquele visual dark melancólico. Cintura dura, não sei dançar, achava aqueles passos escorregadios até esteticamente bonitos, mas jamais tentaria imitá-los, nem os passos nem os requebros insidiosos, embora fosse, além de jovem, também bastante magro quando eles apareceram. Nunca gostei muito de videoclipe, e sei que Jackson o revolucionou. Fico sabendo, agora, que seu álbum mais famoso e marcante, “Thriller”, é de 1982. Teria vendido cento e tantos milhões de cópias, algo assim como a carreira de Roberto Carlos inteira. Poderia ter me apaixonado pelo cara. Tinha 16 anos, época em que a gente se apaixona fácil pelas coisas que surgem assim de repente. Lembro de ter me emocionado com Embalos de Sábado à Noite cinco anos antes. Se pudesse escolher, escolheria os requebros de John Travolta. Aquilo sim eu queria ser. Tinha 11 anos e ouvia sem parar as músicas dos Bee Gees. Adorava aquelas vozes graves dos irmãos Gibb. Podem ser tão bregas quanto Michael Jackson, mas a lembrança que tenho de Thriller é de as músicas deste disco serem tocadas com muita insistência, talvez mais do que a lambada e o Fuscão Preto juntos. Nunca gostei muito dessas músicas que são tocadas a todo instante, de encher o saco. Nem as de Raul, que eu adorava. Dos 15 aos 17 anos, quando já passei a entender um pouco mais de tudo, já julgava Travolta um tonto e curtia muito MPB. Adorava Rita Lee, Belchior, Tim Maia, Jorge Ben. Ficava me perguntando por que Chico Buarque não gravava mais discos e ouvia todas aquelas velhas canções maravilhosas. É o cara, é ocara. No colegial, acho que também em 82, fiquei de cara quando ouvi Alceu Valença. Lembro de pegar a capa de “Cavalo de Pau” antes de uma aula no COC em Ituverava e decorar os nomes de todas as músicas do Lado A e do Lado B. Gostava das maluquices de Pepeu Gomes e Baby Consuelo. Fagner, Djavan, Caetano, Itamar. Em 83, quando ainda morava em Guará, fui a Ribeirão Preto ver um show de Gilberto Gil, “Umbanda Um”, na Cava do Bosque. Ginásio lotadaço, de repente as luzes se apagam, a banda arregaça um som impactante do caralho e Gil surge em meio a uma fumaceira dos infernos. Aquilo sim era de arrepiar. Delírio, meu, delírio. Tinha alguma música, não do Gil, que falava isso e acrescentava: “Você pode perceber nitidamente que estão todos delirando, meu, no mínimo”. De quem era? Aurélio Albano e Pedro Livoratti devem lembrar. Arrigo, Patife, acho. Mas nunca curti Michael Jackson. Cheguei aos 18, entrei na faculdade em 1984 e daí explodiu o rock nacional, com Titãs, Paralamas, Ultraje, Legião, Blitz, Barão, Engenheiros, Kid Abelha, Erva Doce, Lulu, Lobão e o escambau de bico. Paralelamente, Sampa nos oferecia Lira Paulistana, Língua, Joelho. Na faculdade, festinha de república, coisa e tal, Rua Paraíba 322, rolava muito internacional sim, mas daí era Purple, Led, Sabath, Rainbow, as pesadas e ao mesmo tempo sofisticadas bandas de rock, Pink Floyd, porra, gostava delas, mais do que Stones e Beatles. Gostava mais dos psicodélicos, das guitarras melódicas, aqueles solos gigantescos, limpos, Ian Guillan desafiando a guitarra com a voz, aquelas músicas de sete, dez, quinze minutos, aquela coisa menos comercial, pesada e refinada, os caras bons de serviço mesmo. Santana, pô. Van Hallen. Clapton. Meu pessoal, o Bruka, o Rodrigo Garcia Lopes, curtia muito também os negrões do jazz, do trompete, Miles Davis, Armstrong, eu achava legal, mas era mais B.B. King, aquela coisa de fechar os olhos e imaginar cores dando formas àqueles sons. Tom Waits, Velvet, Dire Straits, sim, um pouco de The Cure, mais por causa do Nelson Sato, que, nessa hora, deixava de lado milênios de introspecção e soltava os bichos. Parei naqueles dinossauros. De lá pra cá, não sei o nome de banda nenhuma, música nenhuma, ídolo nenhum. De Michael Jackson, então, não curtia nada. Na boa, não trocaria o gargarejo da Banda Beco no RU, com o Kadu detonando na batera, pelo Michael Jackson no Morumbi. Daquele auge dele, nos anos 80, lembro de uma ou duas músicas com batidas legais, das quais nem sei o nome. Se não curtia o som, podia pelo menos admirar a vida do cara, essas coisas, mas nem isso. Sempre achei estranho aquele celebrismo todo, qualquer peido que ele dava entrava no Fantástico, todo mundo louco atrás do cara, o cara sempre todo de preto e óculos escuros, numas de fazer tratamento para alisar cabelo, ficar branco... Enfim, meus pêsames a quem adora Michael Jackson. Mas eu me incluo fora dessa.
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Rogê, é do grupo Rumo (no meu orkut tem um vídeo com essa música). Eu nunca fui fã de Michael Jackson. kisses
ResponderExcluirValeu, Carina. Você pode perceber nitidamente que, desde aquela época, estamos todos delirando, no mínimo! Beijão.
ResponderExcluirEspero que o Criador se apiede dele. Também não apreciei a produção musical desse moço. Fico também com Bee Geees, aos quais ouço, com The Carpinters e tantos outros, Richard Harrisson, por exemplo. Se é a idade ou não, há que haver seletividade. Claro, 90% do que venho ouvindo nestes tempos são músicas brasileiras e relaxantes. Enfim, querido Rogério, a gente dosa a homeopatia. Abraço e um final de semana feliz. Minha semana foi toda feliz. Passei quatro dias em Ucayali, ali perto onde nasce o rio Amazonas. Estou de boa aberta até agora.
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